Síndica e advogada, Alethea Meira, 50 anos, enfrentou e venceu duas vezes o câncer de mama

 

 

“MINHA VIDA
É ALICERÇADA
EM FÉ, FORÇA
E TRABALHO”

Em abril deste ano, completei 50 anos e recebi presentes inestimáveis, como a minha netinha Maria Helena, filha do Bruno, meu único filho. E ganhei uma linda festa surpresa no Condomínio Conjunto Novo Butantã, o CCNB, um empreendimento com 26 mil m² e 400 unidades, na zona oeste de São Paulo, onde sou síndica orgânica. Assumi a função em 2017 e peguei o condomínio abandonado, mas consegui recuperá-lo e o valor das unidades dobrou. Então, essa festa, organizada por condôminos e funcionários, significou o reconhecimento pelo meu trabalho. Outro presente maravilhoso foi ter tido a oportunidade de completar mais um ano, ainda mais para quem enfrentou e venceu o câncer de mama duas vezes. A minha vida é alicerçada em fé, força e trabalho.

O exemplo de trabalho vem dos meus pais, nordestinos que migraram jovens para trabalhar no Sudeste, onde se conheceram. Eles se estabeleceram na cidade de Osasco e tiveram quatro filhos.  Minha mãe era doméstica, fez cursos, se tornou cabeleireira e conquistou seu próprio instituto de beleza. Meu pai era garçom, depois, dono de restaurante. Eu nunca os vi descansar; fui criada no comércio deles. Morávamos bem e cada um tinha seu carro, mas eles se divorciaram e a renda degringolou.

Aos 14 anos, comecei a trabalhar de quinta-feira a domingo em danceterias de Osasco, que fervilhavam na década de 1980. Passei pela chapelaria, cobrança de tickets na entrada, e, por fim, pelo caixa. Eu sabia que estava lá para trabalhar, por isso não me desvirtuei na noite. E ai de quem me desrespeitasse, afinal, sou ariana (rs!). Eu ganhava bem e investia em cursos. Sempre amei estudar e sonhava em fazer Direito. Ainda pequena, pegava o martelo de carne da minha mãe, fingia ser juíza, e os meus primos eram o júri na brincadeira de tribunal.

De fato, me tornei advogada, aprovada de primeira na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), mas levou mais tempo do que eu havia calculado. Precisei interromper os estudos na adolescência, aos 16 anos, porque engravidei do rapaz que eu namorava à época. Todo mundo queria que houvesse um casamento, exceto eu! Preferi ser mãe solo a me casar. A minha mãe, inconformada, me mandou ficar com uma tia no interior, em Tupi Paulista, ‘longe da vista dos conhecidos’. Assim que o bebê nasceu, eu voltei. Ela alugou uma quitinete para mim e meu filho e nos despachou, dizendo: ‘Quem pariu Mateus, embale os teus’. Ela foi muito dura, mas isso fez de mim uma mulher forte.  

Voltei a trabalhar nas danceterias para custear despesas com o bebê e o aluguel. A madrinha do Bruno, uma senhora muito bondosa, ficava com ele para que eu pudesse trabalhar e, depois, concluir o ensino médio. Mais tarde, vieram bons empregos fixos, primeiro na ACM (Associação Cristã de Moços) de Osasco, depois no Lions Clube, em São Paulo. Em 2000, passei a morar no CCNB, e também ingressei na faculdade de Direito. Emendei a faculdade com a pós-graduação. Iniciei meu mestrado em 2011, mas precisei interrompê-lo para focar na saúde.

Aos 37 anos, encontrei um nódulo no seio esquerdo durante autoexame, o que deu início imediato à minha jornada de enfrentamento ao câncer de mama. Ainda bem que fui rápida porque o diagnóstico precoce da doença aumenta a chance de sobrevivência. Tive medo, mas sou positiva, espiritualizada, e me agarrei à chance de cura.  Antes de o cabelo cair, aproveitei para fazer alguns cortes ousados, afinal, se eu não gostasse, iria cair tudo mesmo. Ao ficar careca, explorei ao máximo lenços e perucas diferentes. Mas não foi fácil. Na mesma época, duas das minhas primas tiveram câncer de mama; só uma sobreviveu.   

“Encontrei um nódulo durante o autoexame, o que deu início
imediato à minha jornada de enfrentamento ao câncer de mama (…) O diagnóstico precoce aumenta a chance de sobrevivência
 

Quatro anos depois, com tudo voltando ao normal, fui diagnosticada com outro tipo de câncer, na outra mama, e informada que, por ser mais agressivo, teria de fazer mastectomia total. Desabei ao chegar em casa e perguntei a Deus o porquê daquilo. A resposta veio em som audível: ‘Porque eu preciso de você muito forte’. A partir daí, entendi que a batalha seria árdua, mas eu venceria.

Tenho como missão promover a campanha Outubro Rosa (de prevenção e tratamento do câncer de mama) onde eu puder, como no mercado condominial, do qual me aproximei infiltrada pela advocacia, pois atendia alguns clientes do segmento. Ainda em 2015, antes da descoberta do segundo câncer, eu até fiz curso de sindicatura com o objetivo de me comunicar melhor com esse nicho e advogar para mais clientes. Já a ideia das campanhas que venho promovendo aos síndicos nos últimos anos é contribuir para que levem boas informações para seus condomínios.

Em 2017, decidi abraçar o posto de síndica depois que um grupo de moradores do CCNB bateu à minha porta pedindo que eu me candidatasse porque havia algo errado na gestão do condomínio. Eu era um pouco negligente, não ia às assembleias, não por querer, mas me faltava tempo. Mas, ainda assim, aceitei me candidatar para entender o que estava se passando. Após eleita, contratamos uma auditoria que revelou vários desacertos e levamos o caso à Justiça. A minha intenção inicial era ficar um ano no cargo, mas já se passaram sete anos! Com uma força-tarefa, reduzimos a inadimplência de 27% para 3%, reformamos lajes e itens de lazer, como piscinas e quadras, pintamos os 20 blocos, implantamos pet place e minimercado.

Por ser advogada, blindei o CCNB em algumas áreas, como a trabalhista, mas para quem não tem essa formação, eu digo que vale a pena contratar uma assessoria jurídica, e vou dar um exemplo do que acontecia com a antiga prestadora de serviços de mão de obra. Essa empresa não era especializada em segurança, mas pôs um porteiro na função, em pé, do lado de fora do condomínio. E se ele levasse um tiro e morresse? O condomínio teria de indenizar a família por incontáveis anos. São detalhes como esse que podem minar as finanças.

O trabalho no CCNB me rendeu convites para administrar condomínios de diferentes perfis, alguns mais antigos, outros, novinhos em folha, como um condomínio-clube que implantei em Guarulhos, com 1.400 unidades. Mas eu me impus um limite de condomínios porque tanto a sindicatura quanto a advocacia são coisas que eu faço com muito amor e muito carinho e quero poder dar para ambas o melhor de mim. Às vezes, abro mão de um novo condomínio ou processo, mas assim consigo transitar bem entre dois mundos que me completam.”

Alethea Meira, em depoimento a Isabel Ribeiro

Matéria publicada na edição 305 out/24 da Revista Direcional Condomínios

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